Não é novidade para ninguém que os dois maiores clubes do futebol brasileiro de 2016 para cá são Flamengo e Palmeiras, não necessariamente nessa ordem.
Há uma disputa em alto nível entre esses dois times que souberam se reinventar há mais ou menos uma década, melhorando de forma substancial as suas administrações, investindo em estrutura, na base e, claro, em reforços que batem recordes nas janelas de transferências.
A tabela do Campeonato Brasileiro mostra, desde a 3ª rodada, o Flamengo em 1º lugar e o Palmeiras na 2ª posição. Sinceramente, será difícil que os dois não estejam no pódio desta disputa no final do ano, afinal os pontos corridos premiam normalmente os melhores elencos e os trabalhos mais sólidos.
Talvez conquistem algum outro título, como a Libertadores, a Copa do Brasil ou quem sabe a Copa Intercontinental (acho difícil imaginar o primeiro lugar no Mundial de Clubes, embora acredite de verdade em boas campanhas do Mengão e do Verdão no novo torneio a ser realizado nos Estados Unidos no meio do ano).
Não é de agora que falamos em uma espécie de “espanholização” do futebol brasileiro, mas está cada vez mais nítido que dois clubes se destacam consideravelmente do resto da turma.
De 2016 para cá, são seis títulos brasileiros da dupla Flamengo/Palmeiras. As exceções foram o surpreendente Corinthians de Fábio Carille em 2017 (quando os mais poderosos ainda não faturavam R$ 1 bilhão por ano), o Atlético-MG de 2021 (em um esforço hercúleo com ajuda de mecenas para encerrar o jejum de 50 anos sem taça do Brasileiro) e o Botafogo de 2024 (às custas de uma SAF estadunidense que virou exemplo de sucesso no futebol sul-americano).
Nos anos 60, o Palmeiras praticamente dividiu os títulos nacionais da época com o Santos de Pelé. Enquanto o time do “Rei” faturou cinco Taças Brasil e um Robertão, o Alviverde ficou com dois troféus da então copa nacional e duas taças do campeonato que foi a extensão do tradicional Rio-São Paulo.
Vimos exceções naquele período, com os títulos da Taça Brasil do Bahia (1959), do Cruzeiro (1966) e do Botafogo (1968), ressaltando que nesta última edição da copa nacional tanto o Palmeiras quanto o Santos abandonaram a disputa. O Fluminense ainda venceu o último Robertão, genuíno embrião do Campeonato Brasileiro.
Posso dizer que, nesta era recente do futebol brasileiro, o endinheirado Flamengo ocupou o posto que era do Santos na década de 60 ao lado do Palmeiras em termos de dominância no país. Não é à toa que hoje os dois clubes com mais títulos nacionais, com certa sobra, são os dois primeiros colocados e favoritos deste Brasileirão de 2025.
O Flamengo e o Palmeiras, já de largada, venceram duros jogos fora de casa e conseguiram resultados e performances marcantes. Se o Rubro-Negro aplicou a grande goleada da disputa até aqui, apresentando o futebol mais vistoso do país nas mãos do técnico Filipe Luís, o alviverde de Abel Ferreira amassou o grande rival Corinthians e tirou a invencibilidade do Inter no ano mesmo jogando no Beira-Rio.
Esse foi apenas o cartão de visitas dessas duas forças, que só agora estão começando a usufruir na temporada de alguns jogadores importantes, como Pedro, Paulinho e Vitor Roque, todos com nível para a atual seleção brasileira.
Paralelamente ao sucesso financeiro e esportivo de Flamengo e Palmeiras, outros grandes clubes do país que teriam potencial para brigar de fato pelas principais taças sofrem com administrações caóticas e temem mais rebaixamentos e quebras do que qualquer outra coisa.
Eu posso começar falando do Vasco, que vive um século amargo recheado de quedas e de perda de competitividade. O Gigante da Colina acreditou que uma SAF poderia mudar o curso da história e que jamais o time enfrentaria o rival Flamengo de novo em condição de inferioridade. Puro engano…
O Vasco venceu apenas duas vezes o Rubro-Negro em mais de 30 partidas recentes entre eles. A próxima será neste final de semana, e a tendência é de um novo triunfo do Flamengo no Maracanã, hoje administrado pelo time que tem mais condições de mantê-lo (bem mais inclusive que o sócio Fluminense).
Pedrinho assumiu a presidência do clube associativo com poderes e recursos limitados e mantém acesa a esperança de que alguma SAF possa tirar o clube da Cruz de Malta do atoleiro. Parece, infelizmente, não existir outra saída neste momento do que vender uma marca tão histórica e popular por um preço de banana.
Já vimos esse filme passar também em Belo Horizonte com o Cruzeiro, que penou alguns na Série B e esteve a ponto de ir para a 3ª divisão e até de ter a sua falência oficialmente decretada.
Recentemente, o novo dono do Cruzeiro, também um Pedrinho (Pedro Lourenço), já mostrou certo arrependimento por assumir o clube do coração, alegando que jogadores e empresários ganham muito dinheiro e que é uma loucura investir em futebol (supermercado, pelo jeito, é melhor negócio).
Vamos mudar o foco para São Paulo, o Estado mais rico do país que sabe jogar bastante dinheiro fora. Corinthians e São Paulo estão atolados em dívidas. O Alvinegro, além de ter uma arena bilionária para quitar (algo que não consegue nem com a ajuda da vaquinha de sua fiel torcida), vê seu presidente, Augusto Melo, entrar em delegacia cercado de seguranças tentando explicar o que seria o maior contrato de patrocínio deste país. O dirigente corintiano disse à polícia ser inocente, mas deve ser indiciado pelo “caso VaideBet“.
Julio Casares, o homem que vende a ideia de estar colocando o São Paulo nos trilhos, levou a dívida do clube para aproximadamente R$ 1 bilhão (foram inacreditáveis R$ 287 milhões de déficit apenas em 2024). Na gestão do atual presidente tricolor, a dívida ultrapassou e bem o faturamento do clube. A justificativa para isso, segundo ele, é um time competitivo, que foi capaz de vencer uma Copa do Brasil em 2023. Já estamos em 2025 e ele alega ainda estar enrolado com questões da pandemia. Mal consegue pagar seu elenco enxuto em dia.
Há, sim, um temor dos são-paulinos com um inédito rebaixamento diante do que temos visto em campo. E, pior, há quem conheça a fundo os bastidores do clube que acha que o Titanic já está afundando e não tem mais como consertá-lo, a solução para evitar a falência seria vender, mesmo que só a base, para o magnata grego Evangelos Marinakis ou virar uma SAF de vez e tentar ter melhor sorte e preço no mercado do que Vasco e Cruzeiro.
O Santos, por sua vez, apostou quase todas as suas fichas para esta temporada em Neymar e no pai dele, que tem colocado uma boa grana para melhorar a estrutura do clube. Entre o sonho de uma moderna arena para substituir a lendária Vila Belmiro e a possível transformação em SAF para ser bancado de vez pela família Neymar, o clube de Pelé viu seu CEO, Pedro Martins, dizer que o “saudosismo vai matar o Santos”.
“Este clube parou no tempo. A gente tinha a compreensão de que, depois do acesso, as coisas voltariam ao normal. Para que a gente consiga fazer o Santos campeão, a gente precisa entender o que fez com o que Santos caísse, o que aconteceu com a instituição. Um clube deste tamanho não cai de divisão à toa”, falou o sincerão CEO santista.
Os grandes do Rio Grande do Sul, que sofreram muito no ano passado com as enchentes, ainda não estão em situação de competir economicamente com Flamengo e Palmeiras.
Talvez, por essa limitação financeira diante dos principais clubes do “Eixo Rio-São Paulo”, não tenham conquistado ainda um título brasileiro na era dos pontos corridos (embora o Inter por duas vezes tenha beslicado a taça e tenha reclamado de fatores extracampo que o impediram de ser campeão).
Os clubes do Nordeste melhoraram demais em termos administrativos e esportivos, mas ainda estão um pouco atrás (claro que por razões financeiras) quando o assunto é brigar pelas principais competições nacionais e internacionais.
John Textor, o dono do Botafogo, chegou a dizer que, “se não fizermos nada agora, o Bahia vai ganhar 20 campeonatos seguidos”, alegando que o time nordestino parceiro do City Football Group está trazendo “o dinheiro do petróleo para casa”.
Quem conhece um pouco só de futebol brasileiro sabe que nem o Santos de Pelé nem o Flamengo e o Palmeiras dos últimos tempos ganharam tantos campeonatos seguidos.
O Manchester City chegou a ganhar sua Champions League e quatro edições da Premier League, nunca foi imbatível. Talvez o Paris Saint-Germain, tão dominante na França nos últimos tempos, conquiste sua tão sonhada Champions League agora, mas não vai criar um império na Europa.
“É tempo de Botafogo” foi a frase de 2024. Mas a verdade é que ainda vivemos a era de Flamengo e Palmeiras no topo do futebol brasileiro.